27 dez., 2020
Publicado por Iago Leonardi. 27 de dezembro de 2020. V ocê , já teve a sensação que é explorado no trabalho, ou mesmo que teve direitos decorrentes do contrato de trabalho desrespeitados pelo empregador? Se você se encontra nessa situação, provavelmente já pensou em “pedir a conta”, mesmo sabendo que essa atitude acarreta a perda de alguns direitos que seriam pagos em caso de demissão sem justa causa. Agora imagine um mundo em que o empregado pudesse “demitir por justa causa” o empregador pelo descumprimento das obrigações contratuais. Essa possibilidade existe! Trataremos neste artigo sobre a rescisão indireta do contrato de trabalho, conhecida também como justa causa patronal, e te explicaremos como identificar uma situação que pode ensejar a rescisão do seu contrato de trabalho sem perder seus direitos trabalhistas. Sabendo da dificuldade de compreensão destes termos, começaremos explicando seus significados. O QUE É RESCISÃO INDIRETA? A rescisão indireta ou justa causa patronal é a rescisão do seu contrato de trabalho por culpa do empregador/empresa, seja pelo descumprimento de direitos trabalhistas (forma mais comum) ou outras que serão explicadas ao longo do artigo. É de conhecimento geral que o empregador/empresa pode demitir seu funcionário quando o mesmo descumpre suas obrigações ou tem comportamentos que justifiquem a demissão (a famosa demissão por justa causa). Ora, da mesma forma, o empregado pode romper o contrato sem precisar abrir mão de verbas rescisórias quando a empresa para a qual ele trabalha também descumpra obrigações ou tenha um comportamento que justifique a saída do trabalhador. Essa modalidade de rescisão guarda certa semelhança com o pedido de demissão comum, afinal, é uma iniciativa do próprio funcionário. Contudo, não implica na renúncia de nenhum direito e o empregado recebe todas as verbas rescisórias que teria direito em caso de demissão sem justa causa. E QUAIS SÃO AS HIPÓTESES DE RESCISÃO INDIRETA? As situações que ensejam a rescisão indireta derivam da própria lei, (artigo 483 da CLT), vejamos: "Art. 483 – O empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando: a. forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato; b. for tratado pelo empregador ou por seus superiores hierárquicos com rigor excessivo; c. correr perigo manifesto de mal considerável; d. não cumprir o empregador as obrigações do contrato; e. praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama; f. o empregador ou seus prepostos ofenderem-no fisicamente, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem; g. o empregador reduzir o seu trabalho, sendo este por peça ou tarefa, de forma a afetar sensivelmente a importância dos salários." Você, trabalhador, provavelmente conseguirá identificar alguma situação que já passou. Pela natureza do serviço exigido. a) forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato. A primeira parte do dispositivo refere-se à força muscular do trabalhador. Por exemplo, a mulher pode carregar peso no limite de 20kg em trabalho contínuo ou 25kg no trabalho ocasional, segundo o artigo 390 da CLT. Ultrapassado esse limite, o trabalho é inadequado. A segunda parte do artigo traz o termo “defeso por lei” que quer dizer “proibido por lei”. É o caso do funcionário que é obrigado a realizar vendas sem nota fiscal, por exemplo. A terceira hipótese trata dos serviços que são contrários aos bons costumes. Você deve estar se perguntando: o que são bons costumes? Sim, é um termo subjetivo e que pode trazer diversas interpretações. Podemos citar como exemplo um estabelecimento que possui conduta discriminatória e que obriga seu funcionário a assim proceder. A parte final “alheios ao contrato” traz a situação em que o empregado é obrigado a realizar funções ou atividades não contempladas pelo contrato de trabalho. Um exemplo muito comum é o desvio de função. Pelo tratamento recebido. b) for tratado pelo empregador ou por seus superiores hierárquicos com rigor excessivo; Aqui cabe a rescisão indireta quando o funcionário é tratado com demasiado rigor pelo empregador. Esforço excessivo e cobranças intermináveis podem caracterizar a hipótese de rescisão. Exposição ao perigo. c) correr perigo manifesto de mal considerável. Perigo manifesto e mal considerável devem ser interpretados como riscos claros e evidentes e consideravelmente perigosos. Imagine a hipótese de, após iniciar seu trabalho, o empregado descobrir que o estabelecimento guarnece soluções inflamáveis e não adota as medidas de segurança necessárias. Note-se que há perigo de mal considerável e, nessa situação, o empregado pode “demitir o empregador”. Pelo descumprimento de obrigações contratuais. d) não cumprir o empregador as obrigações do contrato Esta é a forma mais comum de caracterização da rescisão indireta. Atrasos no pagamento dos salários, FGTS não depositado, descumprimento de direitos garantidos por acordo coletivo (vale alimentação, participação em lucros, auxílios, abonos, etc.) são exemplos de descumprimentos que podem gerar a rescisão indireta do contrato pelo empregado. Por ato lesivo da honra e boa fama. e) praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama Inicialmente é importante explicar que “preposto” é o termo jurídico para representante da empresa. Aquele que representa o empregador também pode ser responsável pelo dano moral. Ofensas, injúrias e difamações são exemplos de condutas que possibilitam a rescisão. Um exemplo é a hipótese em que o superior acusa o trabalhador de furto no estabelecimento, expondo-o diante dos demais trabalhadores e terceiros. Por agressão física. f) o empregador ou seus prepostos ofenderem-no fisicamente, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem. Esta hipótese dispensa maiores explicações. A agressão física pelo empregador ou seus representantes ao empregado pode ensejar a rescisão indireta do contrato de trabalho. Importante somente salientar que, em caso de legítima defesa do empregador ou preposto (agressão partindo do trabalhador), não se aplica este artigo de lei. Pela imposição de prejuízo econômico. g) o empregador reduzir o seu trabalho, sendo este por peça ou tarefa, de forma a afetar sensivelmente a importância dos salários. Esta hipótese também dispensa maiores explicações. Importante: a redução feita por comum acordo, negociada pelo próprio empregado ou pelo sindicato da categoria não caracteriza hipótese de rescisão indireta. Nos casos de redução de jornada e salário que ocorreram em decorrência das medidas de enfrentamento do novo Coronavírus, não há justificativa plausível para a rescisão indireta. ENTENDI O QUE É RESCISÃO INDIRETA E QUAIS AS HIPÓTESES DE CARACTERIZAÇÃO, MAS, E AGORA, COMO DEVO AGIR PARA APLICÁ-LA? Embora o instituto da rescisão indireta seja uma luz no fim do túnel para muitos trabalhadores que se encontram nas situações acima descritas, sua aplicação não é tão simples. Primeiramente, é de fundamental importância buscar auxílio de um advogado especialista em Direito Trabalhista para orientá-lo aos procedimentos necessários para aplicação da rescisão. A atuação do advogado é indispensável, haja vista que a rescisão indireta somente pode ser aplicada por sentença judicial que reconhecerá a justa causa do empregador. O advogado analisará a situação concreta e avaliará se ela se encaixa em alguma das hipóteses de rescisão indireta previstas na lei e nas interpretações dos tribunais sobre vários tipos de situações comuns. Depois da análise do caso, o advogado orientará o cliente sobre como se preparar para o processo. Um dos pontos cruciais é a produção de provas. Assim, o advogado trabalhista orientará o empregado sobre como obter as provas necessárias para garantir força às alegações e aumentar a chance de um resultado positivo. E O QUE ACONTECE QUANDO FOR RECONHECIDA A RESCISÃO INDIRETA? Após reconhecida a rescisão indireta por sentença judicial, a primeira consequência é o encerramento do contrato de trabalho. Agora entra uma importantíssima observação: o fato de iniciar o processo judicial para declaração da rescisão indireta não autoriza o empregado a abandonar o trabalho. Ele também não pode pedir demissão, pois isso impediria a declaração da rescisão indireta. A segunda consequência da rescisão indireta é que o empregador deverá pagar ao empregado todas as verbas que são pagas quando ocorre uma despedida sem justa causa. Esperamos que você tenha aprendido através deste artigo o que é a rescisão indireta, pontos mais importantes e como poderá utilizá-la. A mensagem que queremos transmitir é que não há tolerância para injustiças. Assim como o empregado pode ser despedido por justa causa, ele também pode encerrar seu contrato por justa causa do empregador.